Ah, Porto Alegre, província quase-cosmopolita da saudade.
Sinto em meus dedos e minhas unhas compridas na mão direita, em meu tornozelo e joelho doídos de tanto pedalar sem rumo e sem ouvir a rua, no mesmo Sol dia após dia caindo ao longe no lago Guaíba, a vontade de estar de novo na capital do Sul do Mundo. Voltar pra terrinha não me trouxe muitas expectativas, nem muitas vontades de ser aqui. O desrespeito para com os usuários no vôo, a chegada atrasada que me obriga a justificar um voto que já seria decidiamente nulo, e uma pequena briga familiar superada por uma geração bem mais sábia e paciente, me deixaram tristes e sem vontade de além de ser aqui, também sem vontade de ser daqui.
Um misto de pequenas expectativas com os micro-encontros, e uma nova cidade abruptamente se ergueram sobre minhas pupilas. Sobre a janela da alma, como afirmam alguns, vi de cima, bem de cima, com as mãos suadas, uma cidade que até então era pouco conhecida. Era a cidade de todos os horizontes, de casebres e casarões, de dois grandes estádios e pequenos atos de graciosidade, de ótimas companhias e amizades em potencial, que pediu espaço em alguns de meus devaneios. De uma hora para outra, como um sopro leve no ouvido e que arrebata um espírito muito mais idealista e crédulo na vida que anteriormente, a maravilhosa beleza simples e sincera das coisas pequenas me fez sentir vivendo Porto Alegre de novo.
Toda terra do cosmos encrustado em mim pareciam não dar mais conta, e não conseguiam suportar tamanho ar, tamanho fogo flamenco e a morenice moura outrora esquecida na história mais nobre da América Latina. Eu estou pronto e preparado para me apaixonar pela minha cidade novamente. Parafraseando Caetano, “Ninguém supõe a morena/ Dentro da estrela azulada / Na vertigem do cinema / Mando um abraço prá ti / Pequenina como se eu fosse / O saudoso poeta / E fosses a Paraíba…”
Da mesma forma, é preciso coragem para enfrentar algumas escolhas, aceitar as responsabilidades de um projeto deixado de lado e fazer-me entender que a duração é feita de muitas rupturas, de muitas lágrimas, tristezas e esquecimentos, em meio a novos sorrisos, novas expectativas e medos, novos desafios à uma subjetividade pouco conhecida e muitas vezes tratada com covardia. Nada parece ser mais brilhante e desafiador do que algo novo, algo inesperado e instigante. Nada é mais difícil para a racionalidade dura das coisas entender as múltiplas temporalidades das relações humanas.
Pois já me decidi. Já não me encontro preso, ja vi e re-vivi velhas fotografias, e já sei que agora as cosias serão diferentes.
Como é bom estar vivo!!!