Devo confessar, aos amantes e admiradores do amor romântico, barroco ou renascentista, que nunca fui muito bom com sentimentos. A sinceridade me atrapalhava, e a vontade pueril e jovem de querer sempre ter conforto me faziam acreditar que nunca poderia existir algo tão forte, sincero e espontâneo como os lindos e longos beijos salvadores de filmes comuns. Sempre torcia muito mais pro James Dean que pro Fred Aster, e preferia, desde pequeno, as canções dos Stones do que Beatles. Como eu disse, frivolidades de tempos alhures, mas bem aproveitados. Experiências estéticas e sentimentais ignorantes e, ao mesmo tempo, medianamente “intelectualizadas”.
A vida vivida, talvez única contradição aceita pela metafísica dos comuns, sempre dizia que nada era mais importante do que nunca crer em nada que não fosse devidamente explicado e sujeitado à condição racional do devaneio lúcido, e por isso mesmo, contraditório. Confuso, não? (E eu com isso?). Temerário, porém não menos prazeroso, era sofrer por algo fútil, e simplesmente fácil de esquecer. Mesmo que fosse com a mesma pessoa, era sempre algo novo, pois havia sempre a possibilidade de um novo sofrimento, e com ele, doses homeopáticas de prazer. Na homeopatia nunca acreditei, e nem imagino-me crente nos próximos duzentos séculos.
O mesmo pode-se dizer da conjunção astral. Não é de bom tom, para um “cientista” das horas comuns, um analista da vida social, acreditar em formas tão pouco humanas de prever o futuro das almas perdidas. Pois imagine você, no meu lugar, tendo que pensar que toda essa racionalidade sentimental, e toda esse controle da fruição não passa de uma complexa teia e um arranjo imanente de um imaginário do devaneio.
A questão não é, meus caríssimos e raros leitores, explicar o tal do belo e do feio, do gosto e do asco, ou do certo e errado. O ponto principal é entender que não há, no universo inteiro que conhecemos pelos astrólogos e astrônomos, algo pleno o suficiente para explicar a vontade, a poética do espaço e da vida vivida em toda sua efemeridade coletiva e complexidade individual. Não há nada que me faça entender, ou me satisfaça o suficientemente, em toda sua retórica e sua performance, o que sinto agora.
O fato é que amo, e não é minha mãe, nem ninguém da minha família. Estes também amo, mas desse sentimento nunca duvidei. Amo, mais que nunca, os defeitos de alguém que é tão humana, e por isso mesmo tão única quanto eu, e amo saber que escolhi, mesmo que em parte sem poder escolher, estar do lado desses defeitos. Gosto desse afrontamento ao julgamento social, e prefiro que continuem julgando, para continuar dando-lhes prova de que realmente não preciso da aprovação de ninguém.
Certamente a intensidade das coisas, dos fatos e das elucidações causa um tanto de medo, mas é tão simples, harmonioso e complexo do jeito que sempre parece que vai ser, que não há nada que me diga que será diferente. Aos que preferem se afastar disso, compreendo. É plausível a manutenção de certos confortos, e a hesitação na hora de exprimir os confrontos. O certo é que deixar de se expressar, em certos momentos, é quase a mesma coisa que deixar de sentir. Em alguns casos, mesmo que não pareça, nossas vontades não estão tão distantes do que vivemos, nossa razão não está tão certa, e nossos devaneios não estão tão loucos.
Como ouvi de um sábio mestre, é melhor viver assim, do que morrer aos poucos, sem saber que se morre um pouco mais a cada dia. Deixar de fluir, é deixar de sentir. É privar-se do mais lindo que a vida proporciona: o grande, suntuoso e surpreendente, o imprevisível e incontrolável sentir estar vivo. Eu vivo, e por isso mesmo, sinto hoje, que amo. O bom mesmo é saber que amanhã pode ser diferente, mais intenso, e por isso mesmo, mais espontâneo e surpreendente…