O estrangeiro

O estrangeiro por sua natureza não é proprietário do solo, e o solo não é somente compreendido no sentido físico, neste caso, mas, também, como uma substância delongada da vida, que não se fixa em um espaço específico, ou em um lugar ideal do perímetro social. Nas relações mais íntimas de pessoa a pessoa, também, todas as atrações e significâncias possíveis no cotidiano das experiências simbolizadas podem revelar o estrangeiro. O estrangeiro é sentido, então, precisamente, como um estranho, isto é, como um outro não “proprietário do solo” (Simmel, em O estrangeiro)

Estranho essa coisa de sentir. Nada é tão certo, e nada é tão concreto. Problemas para um virginiano, ou para alguém que teima em querer ter explicação para tudo. Há três meses aceitei e lutei por um projeto que parecia ser interessante e que me faria feliz. Fez, foi interessante, e a prova disso é que agora me vejo de novo, no meio de sentimentos tão confusos e díspares quanto qualquer pessoa que vive as coisas intensamente.

De um lado, começo a sentir a “ressaca” da volta, aquela saudade de algo que se viveu intensamente todos os dias. Das buzinas, das muitas buzinas. Das empanadas, do vinho barato, e da tentativa constante de tentar entender e por vezes até falar uma língua diferente. Sinto como se a vida, o cosmos, me tivesse brindado com uma convivência tão rica em um país que ao mesmo tempo parece tão próximo e tão distante. Há muitas fronteiras. Geográficas, físicas, sentimentais, e principalmente culturais, mas nenhuma delas me impediu de curtir cada passo desviado de fezes de cachorro, cada centímetro disputado no “subte”, cada viagem longa de ônibus, e todas as comidas, bebidas e bares que, mesmo se repetindo, eram sempre surpreendentes.

Fiquei longe de muitas coisas que gosto demais, e isso me provoca esse outro lado que me faz ficar feliz e impaciente para a volta. Não, não é do calor que estou falando. Eu to falando é das pessoas. Mesmo que duas das mais importantes tenham vindo me visitar, sinto que cada vez mais preciso de pessoas boas ao meu lado. Sinto que não há nada mais valioso que sentimentos sinceros, e que nada substitui uma amizade honesta. Quero voltar, quero dormir do lado de quem amo, e quero sentir os amigos próximos.

Ao mesmo tempo, e por isso que é tudo tão rico, senti nessa distância, pessoas se aproximarem ainda mais. Fui a lugares indicados por pessoas que me fizeram olhar para um outro mundo de várias formas diferentes. Senti que não sinto tanta falta de uma cidade ou outra, mas daqueles que estão ao meu lado. De uma forma muito estranha, me dei conta de que minhas escolhas sobre meu futuro não são tão certas, e que, de uma hora pra outra, tudo pode mudar e me fazer ver as coisas de uma forma bem mais sensível do que eu as via antes.

E assim, o tempo e suas ardiduras insistem em me ensinar coisas, me perceber ignorante, curioso e cada vez mais aberto às suas lacunas, rupturas e incertezas. Sentir é, inevitavelmente, estar imerso intensamente em contradições e sensações alternantes.


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